quatro paredes e uma porta
Do meu lado esquerdo tenho todos os livros que possuo, boa companhia se têm mostrado, levando-me a viver vidas que tanto tenho como dos intervenientes da história e do seu autor, como minhas. À minha frente está uma chávena de chá, - de facto, está uma chávena, porque o chá já há muito desapareceu - o estático portátil onde escrevo estas linhas e uma qualquer música dos Elysian Fields a acompanhar. É estranho o tempo que ainda consigo perder em frente a este computador, sempre a fazer qualquer coisa supostamente produtiva mas que em nada me agrada. Do lado direito, a parte melhor do meu quarto. Digam que o meu agrado devia ficar do lado esquerdo, não interessa, neste caso está do lado direito. Uma brancura imensa ocupa todo o céu, o que está por baixo não interessa, é como um grande borrão - tal como são quase todas as cidades deste país - criado por uma falta total de planeamento. Como digo, não interessa. O esplendor, esse prende-se com o que está lá em cima, com a liberdade e plenitude que todo este céu de Novembro transmite. Atrás de mim tenho uma parede recheada de boas recordações, como portais de um qualquer livro de ficção por onde posso recuar no tempo. Ao lado da ficção, a realidade: a porta que chama “sai deste quarto” onde passo a maior parte da minha vida, quer queira quer não, e que me leva a experimentar tudo o que me faz realmente feliz.
No entanto, hoje não lhe dou ouvidos. Hoje, o meu dia quer-se aqui, entre as quatro paredes e sem passar por aquela porta. Há dias assim.
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"Mas a operação de escrever implica a de ler como seu correlativo dialético, e estes dois actos conexos precisam de dois agentes distintos. É o esforço conjugado do autor e do leitor que fará surgir o objecto concreto e imaginário que é a obra do espírito."