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paranóia

Saíste de casa com cara de miúdo ensonado, atento ao delicioso creme das nuvens e aos frescos cheiros da rua. Sorriste a quem passou por ti e acenaste a quem pensavas conhecer, seguiste o teu caminho de queixo erguido, confiante de que o teu mundo é melhor que o dos outros, não por presunção mas simplesmente porque é teu, ilustrado pelas tuas cores de rapaz sonhador, guiado pelo teu desconexo e maravilhoso querer. Passeaste pelas veias adormecidas da cidade, atentaste nos barulhos que dela suspiram, deixaste-te levar pela sua atmosfera de aldeia indiscreta, apaixonaste-te pela multiplicidade de escolhas que ela te deixa fazer e pela diversidade das tuas reacções ao que ela faz em ti. O isolamento faz-te mal, oxida e deprime, humilha a vitalidade necessária à condição humana, enfraquece a espontaneidade dos sentimentos e a astúcia da fantasia. A liberdade que se inspira no ar, a energia que se retém da vida citadina, os gemidos que se captam e os soslaios que perduram fazem com que o animal mais desprevenido deseje o contacto. Mas tu sonhaste, desejaste e voaste quando saíste de casa com cara de miúdo ensonado, cansado do sono que te afecta enquanto a cidade dança lá fora. Percorreste a atmosfera inebriante, deixaste-te contagiar pelo bonito e pelo feio, apaixonaste-te. E no entanto, mal chegaste a casa tudo se desfez.

Dentro de mim, a paranóia alastra com descarada lentidão, consumindo sem licença o bom-senso e a vontade, deixando, por onde passa, cinzas das grandes árvores que um dia foram fantasias e paixões criadas pelo meu saber. Debilito o sempre fraco pensar com recordações cheias de nada e ideias encantadas de contra-sensos. Perco-me uma, duas, mil vezes no meio de labaredas de gelo púrpura, confusos fios de meadas perdidas. Estou louco. Quero o fogo no céu e as nuvens no inferno, quero fugir de tudo o que é meu enquanto é tempo, soltar-me do cheiro imundo, das mãos apartadas, do corpo miudinho e da mente apagada. Porque é às cegas que rastejo pelo mármore das certezas em busca do interruptor do esquecimento e da paz interior. Pressiono os meus instintos para que trabalhem sozinhos, ou que me deixem em paz. Preciso de uma anestesia, sombras que me enlouqueçam de vez ou que me levem daqui para fora. Por ora, sinto os murros do meu coração dentro de um presente mal embrulhado, com papel rasgado e laço desfeito, descontrolo-me com a perna crepitante e a sua histérica disfunção pneumática, estou fora de mim.

A tua cabeça é sala de estar para milhares de aranhas que lutam por uma posição melhor para te destruir um pouco mais a lucidez que esmorece, numa insuportável dor aguda que te despedaça como um contínuo choro amargo, na garganta as pontadas que reis e rainhas de outros tempos deferem com as suas espadas afiadas são actos imparáveis que assassinam qualquer pensamento saudável que tentas produzir. Não consegues engolir, não te deixam respirar, já não sabes o que é dormir e tão-pouco como é pensar. Agarras o escroto procurando a dor que não vem, tentas extinguir a loucura das chamas frias que não deixam de te queimar com prazer, deambulas entre paredes por um som que encante o medo da inalterável constância. Não dói. Não dói. Suprime mas não dói, crepita mas não estala, arde mas não queima. Atiras-te ao chão em convulsivos choques de penumbra cerebral, arrastas-te pela ânsia de converter o que vai ser em é e o que é em nunca foi. Dói-te. Agora dói.

Criatividade, simplicidade, bondade, moderação, objectividade, compaixão, humildade, competência, seriedade e serenidade, onde andam vocês? Não consigo. Aqui não. O querer é diferente do fazer e o meu fazer fica lá fundo na lista dos verbos. Às vezes nada sai como queremos. Queria ser eu outra vez, agora, não amanhã. Soltar-me no mundo novamente e deixar-me levar pelo que ele me quer dar. E falta tanto tempo para tudo. Tempo de mais para quem não tem tempo para desperdiçar, pensando no tempo que já passou a pensar no tempo que ainda vai passar. Nas bordas de porcelana da banheira caem silenciosas gotas do mais índigo dos vinhos, fantasias sofridas de um paranóico desperdício de vida à espera de uma salvação caída de um céu que só às vezes existe. A casa, essa canta.

Je ne veux pas travailler, je ne veux pas déjeuner. Je veux seulement l'oublier et puis je fume.

escrito por Pedro a 28 maio 2007 //

temores de brincar

Constantemente me recordo do brilho hipnótico daquele televisor antigo, mergulhando a penumbra da pequena sala num inóspito rio de medo enquanto o zunido metálico do aparelho se reflectia pelas divisões vazias da casa onde a minha avó morava. Naquela altura, miúdo concentrado na espantosa magia que a imagem criava e nas histórias sem sentido que elas tinham para me brindar, preenchia as minhas noites de solidão em cima de uma desconfortável e velha poltrona azul, agarrando firmemente os tornozelos, contendo os gritos assombrados de mais uma noite em que eu, medroso, me deixava conquistar pela presença de fantasmas imaginados. Uma casa vazia sempre me fascinou, com os seus cheiros e sons irrequietos todos mesclados numa só crua sensação, desprovida da encharcada e confusa agitação em que o mundo vive fora de cada janela, respirando as histórias que cada parede murmura e sempre esperando que da gaveta com mais pó saia um monstro igualmente poeirento, irrequieto e brincalhão para me contar as horas que o seu dia tem. Naquela altura, as casas vazias eram habitadas por fantasmas faz-de-conta criados por uma infância assustada, sem mais infâncias para partilhar ou redes para amparar quedas desajeitadas. Eram fantasmas que sorriam e inventavam, que me entendiam e tudo partilhavam, quimeras de plasticina em lagos serenos ou espectros de pavor em represa aberta. Sentado naquela sala inundada pelo medo de quem passa a primeira madrugada sozinho, falava com as minhas ilusões na esperança de que elas fossem maiores que o meu corpo, rogando por explicações fáceis sobre o que é feito do certo e do errado, sem gritos intrometidos de uma qualquer cólera extraordinária.

Mas o ontem já lá foi e é neste presente sensabor que interessa atentar. Pois hoje vos digo, irresponsavelmente inquieto mas sem fio de medo a varrer as veias, deambulando perdido pelas sombras indiscretas de uma solidão vagabunda, sou assombrado pelas meigas saudades dos fantasmas da minha infância, essas fáceis metáforas do meu pequenino antigamente.

escrito por Pedro a 24 maio 2007 //

clamor

Olá graciosa e perfumada madrugada, que tal um grito para adoçar o teu céu estrelado?

Podem não te interessar as minhas estórias, a ti a quem basta um brilho de Vénus e um sorriso de Lua para encantar qualquer belo apaixonado mais desprevenido, mas apaga por uns momentos o teu esplendor e atenta ao pulsar controlado que todas as noites tenho de ouvir nas profundezas da minha almofada, perdido no meio de tanta definição e certeza sobre o que quero não fazer, desvairado por não poder seguir aquela canção que manda o mundo mudar de vida. Não te dá vontade de explodir histericamente num espectáculo de auroras imperiais a dançar a mais longa das valsas ao som da orquestra dos oceanos e do coro de uma brisa taciturna? Leva-me daqui, ébria noite dos mais profundos sonhos, transporta-me para onde das alturas vires que a queda é maior - faz-me percorrer o mundo cem vezes ou mais, se assim for preciso, mas oferece-me a certeza de um tombo de gigante – e deixa-me desamparado onde o teu deleite for maior. Mas não pode, diz ela, diz que o nó das amarras é mais forte do que a força do dia e da noite juntos, enfurece-se, endoidece, desiste e destrói-me. E é por isso que gritar se torna a única opção. Numa sonata mal escrita, desespero em enraivecidos cantares de liberdade, solto dos pulmões salvas de lágrimas iradas, dores de pessoas por conhecer e espíritos por ser, solto as cordas de cólera que me prendem a uma infantilidade despegada e grito por eles, exclamo por elas, berro por todos e lanço um bramido por ninguém, esse ninguém que merece mais que todos eles e todos elas, esse ninguém que está preso à cadeira eléctrica da minha exaltação, pronto a ser condenado à morte por toda a companhia que nunca fez e o alento que nunca deu, seguro de que a morte é bem servida a ninguém quando a todos não se pode culpar. Esta noite sinto-me mais confortável, deitado na areia a contar os pirilampos adormecidos das estrelas enquanto o mar só para mim canta. Nesta praia vazia, repleta de ti, de todos e de ninguém, tento sair de dentro de mim enquanto é tempo.

escrito por Pedro a 21 maio 2007 //

escassa eternidade

Sinto o sangue a precipitar-se apressado pelos veios das minhas têmporas, deixando-me exausto na tentativa de subjugar a minha liberdade irreflectida. Mordo os lábios até deles cair o seu néctar escarlate, procuro abstrair-me das amarras que criaste no meu espírito, carrega-me morto se for preciso. Tira-me daqui e atira-me para um céu onde tenhas a certeza de jamais sobrevoar. A máquina de escrever encravada que é a minha imaginação não consegue parar de cair em trigais de tesouras afiadas, as minhas pernas enfraquecidas pela demência obrigam-me a percorrer os dois metros e meio que separam as paredes do meu quarto em percursos paranóicos por um alívio de qualquer epiléptico saber que a inocente mais desatenta se possa lembrar de trazer. Rasgo o couro cabeludo com as unhas por fazer, toco brandamente na atmosfera megalómana que me rodeia - acabem com isto, façam-me parar por favor, alguém me segure porque eu vou viver. Por vezes deixas-me assim, sem conseguir discernir se quer qual o modo mais sensato de inspirar a vida e expirar o terror, incapacitando-me de crescer para sempre, qual Peter Pan invertido na mágica e perdida Terra do Sempre. Obrigas-me a esquecer, a arrepender-me e a saber que o percurso natural das coisas varia entre o péssimo e o monstruoso. E são apenas escassos dias. Escassos dias sem aquele temeroso barulho infantil, sem a atroada incisivamente lasciva, a voz ignorante e aquele teu rumor agressivo. São só escassos dias que tu, mesmo sem um olhar atento ou uma atenção desinteressada, tens para me brindar.

Era tarde e ambos nos encontrávamos cansados de uma vida que ninguém pediu mas que pelo menos um tem direito a cobrar. De rosto fechado e sem lugar seguro para colocar as mãos, saíste pela porta levando contigo tudo aquilo que nunca procuraste ser. Mesmo sem o desejar, espero que o encontres.

escrito por Pedro a 19 maio 2007 //

inesperado

Hoje aconteceu-me algo insólito. Acordei forçado, como sempre, pelas primeiras luzes e sinfonias do dia, sendo obrigado a pôr de lado o sonho pelo qual vagueava. Tomei o mesmo banho eléctrico de sempre, numa ameaça directa à boa disposição, vesti-me de forma atrapalhada, sorvi o leite enquanto atentava no despertar da Rua do Zaire e a minha mãe dizia qualquer coisa inusitada ao mesmo tempo que saía atarantada porta fora. Enfastiado pela ideia de ficar em casa o resto da tarde, peguei na bicicleta e voei por entre o trânsito até ao Palácio. Sentei-me no meu banco virado para os Rabelos, peguei no Hamlet que me tem acompanhado, e deixei que passassem quatrocentos anos por entre aquela hora de relaxamento matinal.

Quando voltei a casa, fiz um almoço apressado e sentei-me em frente ao computador para trabalhar. Como ser exemplar no que diz respeito à preguiça, comecei o meu trabalho diário pela leitura de e-mails. No entanto, desta vez foi diferente. Os meus olhos enganavam-me de cada vez que tentava entender o que a mensagem dizia. Lia uma vez, duas vezes, três vezes. Nada. «Ex.mo Sr. Pedro Pinto, Parabéns!». Parabéns, mas parabéns porquê? Não faço anos. Se calhar é melhor ler o resto. «Foi um dos vencedores do Passatempo Interrail decorrido no site CP de 30 de Abri...» Vencedor? Interrail? Nos clandestinos da minha cabeça, naquele instante, caí de bruços por cima do portátil, desmaiado de alegria. Quando despertei, liguei para o número de contacto que vinha escrito no fundo da mensagem. Perguntei à simpática senhora que me atendeu se era para ela natural brincar com coisas sérias, ouvindo assim do outro lado da linha mágica do telefone uma confirmação de ter ganho um passe Interrail para vinte e dois dias de fantasia. Ganhei mesmo, lembro-me de ter pensado. Não consegui por isso evitar passar o resto do dia em viagem, a bordo de um comboio a vapor que partia vagaroso de Lisboa com destino ao Oriente. Sobrevoei a Puerta del Sol em Madrid e os Jardins de Versalles em Paris antes de seguir para a Piazza San Marco em Veneza, Santa Maria del Fiori em Florença, a Fontana di Trevi em Roma, o barco até Patras que me levaria à Acropolis de Atenas, a visita a Tessalónica antes do saltinho ao Hagia Sophia em Istambul e do deslumbramento pelo Castle District em Budapeste, os Palácios Imperiais de Viena, ou a Charles Bridge em Praga. A decisão foi rápida, dia vinte de Agosto parto, de sorriso infantil na cara, à descoberta da Europa.

Não me quero enganar. Há muito tempo que ando amargo com a vida que levo, e parece que alguém lá em cima anda a fazer os possíveis para que o descontentamento desapareça. As Férias Desportivas e a Queima que já lá vão, o Super Bock Super Rock, o Sudoeste, o Paredes de Coura estão quase a chegar e agora aparece a notícia deste Interrail inesperado, antes dos tão aguardados seis meses em Nuremberga, e daquela já pouco secreta surpresa que só deverá chegar, embrulhada em cor-de-rosa ou azul, lá para Outubro. Quem se quiser juntar aos sonhos, é bem-vindo.

escrito por Pedro a 17 maio 2007 //

Hábitos Breves

"Gosto dos hábitos que não duram; são de um valor inapreciável se quisermos aprender a conhecer muitas coisas, muitos estados, sondar toda a suavidade, aprofundar a amargura. Tenho uma natureza que é feita de breves hábitos, mesmo nas necessidades de saúde física, e, de uma maneira geral, tão longe quanto posso ver nela, de alto a baixo dos seus apetites. Imagino sempre comigo que esta ou aquela coisa se vai satisfazer duradouramente - porque o próprio hábito breve acredita na eternidade, nesta fé da paixão; imagino que sou invejável por ter descoberto tal objecto: devoro-o de manhã à noite, e ele espalha em mim uma satisfação, cujas delícias me penetram até à medula dos ossos, não posso desejar mais nada sem comparar, desprezar ou odiar. E depois um belo dia, aí está: o hábito acabou o seu tempo; o objecto querido deixa-me então, não sob o efeito do meu fastio, mas em paz, saciado de mim e eu dele, como se ambos nos devêssemos gratidão e estendemo-nos a mão para nos despedirmos. E já um novo me aguarda, mas aguarda no limiar da minha porta com a minha fé - a indestrutível louca... e sábia! - em que este novo objecto será o bom, o verdadeiro, o último... Assim acontece com tudo, alimentos, pensamentos, pessoas, cidades, poemas, músicas, doutrinas, ordens do dia, maneiras de viver." Friedrich Nietzsche, in 'A Gaia Ciência'